QUEM ROUBOU O SANTO? O rapto da imagem de São Sebastião.
Cadê o santo que estava aqui?
O ano era 2011 e estávamos em um janeiro bem chuvoso. O festejo de São
Sebastião quebrava o clima melancólico que se formava por causa do mau tempo.
Naquele ano, a festa do dia 19 a 21 no Centrinho - povoado próximo a Buritizeira, onde mora grande parte da minha família – era de
Dona Gracinha, sobrinha de meu avô. No ano seguinte, a missão de dar
continuidade à tradição estava sob responsabilidade da minha família, e já
estávamos ansiosos desde então.
Eu, cortando as folhas que ficam sob o bolo de tapioca. 2012.
Como manda a tradição, no dia 20 à tarde, fomos receber a festa. É um pequeno
ritual – e não associe a palavra ritual a feitiço, por favor. Ritual é aquilo
que segue uma determinada sequência, um rito, uma cerimônia. Um batizado é um ritual, uma
missa é um ritual, um casamento é um ritual. Instruídos por Sebastião de
Nezica, o rezador das novenas, ficamos próximos a festa, onde os fogos de
artifício (foguetes) ensurdeciam aos transeuntes, a radiola deixou de tocar
as músicas “dançantes” para tocar a valsa que faz parte de todo o processo. A
dona da festa, nesse caso, deve ir até a capela, pegar a imagem do santo e vir
nos encontrar, para assim, simbolizar a entrega da festa oficialmente. Para a
nossa surpresa, a imagem menor havia sumido. Alguém havia "roubado o santo".
Calma, querido leitor. Não se tratava de caso de polícia e ninguém seria
enquadrado no artigo 155 do código penal. Uma das tradições do festejo inclui
“roubar o santo”. É muito simples: sorrateiramente, subtrai-se a imagem de
dentro da capela e leva-se para casa, onde paga-se promessas ou renova-se os
votos de fé e devoção. Para a devolução, o “ladrão” vem em procissão, com
amigos e familiares soltando foguetes, muitos foguetes, para anunciar que está
chegando. Ao ouvir o som dos fogos, o dono da festa reúne mesas ao pé do
mastro, e coloca cervejas, refrigerantes, bolo de tapioca (esse não falta nas
festas) e tira-gosto. A valsa na radiola anuncia que estão chegando os
responsáveis pelo sumiço do santo. Em 2015, junto com meu irmão Erlande e minha
tia Cleonice, ajudei meu primo Ediarlen a roubar o santo no Centrinho, fizemos
um rapto incrível, pois ele estava pagando uma promessa.
Erlande Pereira, com a imagem de São Sebastião após nosso "roubo". 2015.
Explicado como é o roubo, voltemos a narrativa. Pois bem, naquele ano,
alguém roubou o santo e não devolveu, ou seja, não seguiu o ritual da
devolução. Gracinha veio “entregar a festa” com a imagem maior, e eu quem
recebi. Caracas, como pesava! A tradição manda dar três voltas ao redor do
mastro, na segunda volta meu braço já estava adormecido. Finalizada a terceira
volta, meu braço estava completamente dormente. “Recebida a festa”, após o
ritual religioso, seguimos para a parte profana. Embalados ao som das pedras da
radiola Tornado, dançamos até debaixo da forte chuva. O Dj Frank atendia ao
nosso pedido e nós fizemos a festa naquele dia.
Todos ainda tinham esperança da imagem pequena de São Sebastião aparecer,
mas naquele ano de 2011, ela não apareceu e nunca se soube do seu paradeiro. Até mesmo Sebastião de Nezica, experiente com essas ações, não foi bem sucedido em sua investigação. O
ano transcorreu e finalmente chegou 2012, o ano de nossa festa. Minha família
(pai, mãe, irmãos) estavam muito envolvidos (e claro, eu também), os tios e
primos - alguns mais, outros menos - enfim, todo mundo. A festa era nossa e
passamos o ano todo nos preparando para fazer uma festa bonita e grandiosa, e
por fim, conseguimos. Não compramos outra imagem, todos os rituais seriam
feitos com a imagem maior e pronto.
Mas... não esperávamos por uma notícia: um jovem (que irei preservar o nome), do povoado Deserto (localizado próximo ao local do festejo),
mandou dizer que deveríamos buscá-lo sob o som de foguetes. Prevendo o que se
tratava, pegamos o máximo de caixas de fogos que pudemos encontrar e partimos
na tarde do dia 20 para lá. Para nossa surpresa, um ano depois, encontramos o
raptor da imagem do ano anterior. Havia muita gente na casa dele. Em tempo: Ele
“roubou” o santo, e foi para o Pará, onde mora atualmente e o rapto foi para
pagar promessa. (Eu não tenho certeza, mas acho que o santo também foi para o
Pará)
Foguetes, muito foguetes. O som era ensurdecedor. Alegria, euforia e eu
ajudava a dar alguns comandos; quando chegamos, havia umas 4 mesas ao pé do
mastro, mais de uma dúzia de garrafas de cervejas e mais uma boa quantidade de
refrigerantes, bolos etc. Como donos da festa e anfitriões, era a nossa
obrigação recepcioná-los bem. O jovem rapaz e sua turma fizeram a festa ao
pé do mastro. Finalmente o santo estava
em seu lugar, finalmente devolvido mesmo que um ano depois, e em grande estilo.
Após a parte religiosa, a radiola Ajax Som sob comando de Dida e Walmar, fez a
galera dançar e beber até de madrugada.
Assim, se encerra a narrativa desta que foi uma bela história que pude vivenciar. Enquanto escrevia deu uma boa nostalgia daquela festa que ficamos responsáveis por fazer em 2012.
Quem sabe, algum ano, não faremos outra!!?
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