A MALDIÇÃO DO DEFUNTO DA INGAZEIRA


Naqueles tempos não se falava em depressão no interior, as pessoas sucumbiam a doença até chegar na fase crítica, na maioria das vezes sem apoio até mesmo da família, que por desconhecer a gravidade e seriedade não prestavam o apoio necessário para que houvesse reversão ou melhora do estado já agravado. Raramente alguém chegava ao extremo de tentar contra a própria vida, mas em um desses casos houve um que chocou a população de Pontal (Bequimão/MA), por volta das décadas de 60 a 70. Em respeito à memória dos citados nesse texto bem como aos seus familiares, usaremos nomes fictícios a fim de preservar suas identidades. 

    Seu *João, certo dia, saiu dizendo ir para a roça e dela não retornou, na verdade sequer chegou lá. Era um lavrador, que como todos da região, dependiam da roça para sobreviver. Deu o horário de retornar e nada dele chegar em casa, sua esposa então mandou que fossem até a roça ver se ele estava lá, pensou que podia ter passado mal e por isso não havia chegado ainda, mas seu enviado chegou de lá sozinho e sem saber o paradeiro de seu João. 

    Rapidamente a notícia do sumiço correu e os vizinhos se ajuntaram na noite escura em busca do desaparecido, munidos de lamparinas. Divididos em grupos, espalharam-se noite adentro fazendo buscas que não foram bem sucedidas. Pela manhã, novos grupos se formaram e ampliaram o perímetro das buscas, mas novamente sem êxito, e assim por três dias seguidos seguiram a procura de seu João, os homens em campo e as mulheres unidas com a família em rezas a Deus e aos santos de suas devoções. Findaram as buscas, restava esperar por um milagre, restava apenas a fé e a esperança dele estar vivo.

    No quarto dia pós desparecimento, um bando de urubus chamou a atenção da comunidade por estarem sobrevoando e sentando no alto de uma árvore em meio a mata. Prevendo o que poderia ser, reuniram-se novamente e partiram em direção a dita árvore, cuja copa estava tomada por urubus e, chegando lá, se depararam com uma cena de horror sem precedentes na história da pacata comunidade: no alto de uma ingazeira, estava o corpo de seu João pendurado por uma corda, já em estado de putrefação e com alguns urubus disputando espaço sobre ele. 

    Além da cena ser bastante triste e aterrorizante, os transeuntes ficaram atônitos com duas coisas: primeiro que já haviam passado por baixo da ingazeira várias vezes e nada notaram, e, segundo a dificuldade de escalar a árvore até o local onde estava o corpo já em decomposição. Usando suas próprias camisas como máscaras para suportar o mau cheiro, decidiram que iriam fazer o enterro ali mesmo, debaixo do pé de ingá. Cavaram a sepultura com intuito de que quando cortassem a corda, o corpo caísse dentro dela, mas o plano deu errado e o corpo caiu fora da cova. 

    Para por fim a jornada de sofrimento que seu João enfrentava mesmo depois de morto, seu cunhado (seu Neco) em ato de bravura ignorou o mau cheiro e o estado do corpo e pegando-o, o arrastou até a cova. Findado o enterro e o fim do mistério a cerca do desaparecimento, a população se viu entristecida com toda a história, pois, como eu disse, nunca haviam visto um casso dessa magnitude até então, e todos exaltavam a coragem e determinação de seu Neco.

    Mas, os problemas de seu Neco estavam apenas começando...

     Após ter contato direto com o corpo em decomposição e exalando mau cheiro, seu Neco adquiriu o mesmo odor, como naturalmente era de se esperar. Ocorre que, mesmo após o banho com sabão de coco e uso de loção, o mau cheiro não passou. "Deve desaparecer com os dias", pensou ele, contudo, dias após dia, o odor não passava. Seu Neco então recorreu ao banho feito com várias ervas, que juntas exalavam um cheiro forte de mato, mas também não teve sucesso, fedia como morto mesmo estando bem vivo. 

    Começaram então a dizer que se tratava de uma maldição deixada pelo defunto da ingazeira, por ter seu corpo tocado. Aconselhado pelos mais velhos, foi em busca de um famoso curador, que também lhe receitou vários banhos, benzeu, rezou e fez tudo que podia fazer, ainda assim, o fedor persistia e já causava efeitos no convívio diário, pois onde seu Neco chegava as pessoas se afastavam. A família já não suportava mais, estava ficando insustentável conviver sob o mesmo teto.

    Desesperado, chegou ao extremo de ficar de imerso em um tanque que tinha mandioca de molho, com intuito de ficar com "odor de massa d´agua", mas ainda assim o fedor de defunto se sobrepunha ao de massa d´agua e o desespero o atingiu com golpe de morte. Por conta de tudo isso, seu Neco foi perdendo o equilíbrio emocional e definhando até perder a razão e não demorou a morrer.

    Assim, se encerra a narrativa desta história macabra, triste e cheia de mistérios que não foram e nem serão desvendados. 


Edição e adaptação: Elinajara Pereira Castro

Contribuição: Joana Pereira e Rui Castro (meus pais e contadores de histórias)

Texto publicado sem revisão gramatical





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