Contos de Terror: As conversas do "além" no poço de Vítor.


O converseiro.
       
       É impossível imaginar ou conhecer um povoado  no interior em que não há algum causo que tenha como cenário um poço. No nosso pequeno vilarejo que chamamos de Bom Lugar, localizado entre os povoados  Pontal e Marinho, tínhamos como fonte de abastecimento durante a estiagem o "poço de Vito". Antes de falar do poço, vou chamar a atenção para o seu dono. Vítor era um senhor muito enigmático, diziam que ele andava sobre brasas e não se queimava,  passava descalço por cima de forno de assar farinha mesmo quando estava quente e saía sem uma queimadura na sola dos pés. Quando amolava o patacho, para saber se estava bem afiado, ele testava a ferramenta na palma da própria mão, simulando um corte. Eu o chamava de vovô porque ele era pai de Maria, uma senhora que eu carinhosamente chamo de mãe, pelo fato dela ter cuidado de mim quando estava recém-nascida. Seu "Vito" como nós chamávamos, faleceu com 102 anos de idade há um ou dois anos atrás.

       O "poço de Vito" fica distante  1 km ou mais de nosso vilarejo, em meio a uma mata, andávamos muito para chegar até ele. Nunca houve na região um poço tão resistente, até mesmo nos grandes períodos de seca, ele sempre tinha a mesma quantidade de água, sua nascente era boa e vertia todo o tempo, atendendo assim a nossa demanda. Nos dias de sábado tinha ás vezes 7 ou 8 mulheres lavando grandes quantidade de roupas, passavam a manhã inteira, nesse momento a água diminuía, mas a tarde podia ir lá ver que já estava cheio de novo. 

      O que vou contar hoje se passou há muito tempo atrás, e tem a minha mãe como protagonista desse fato. Mamãe havia chegado da sede da cidade de Bequimão por volta de umas 16 horas, após receber o seu salário. Mesmo estando cansada pelo fato de ter feito o trajeto de mais de 40 km a pé , teve de ir ao  poço de Vito para tomar banho e trazer água para casa. Ia pelo caminho fazendo alguns cálculos mentalmente, sobre quanto havia recebido, sobre as despesas e as contas que havia de pagar. Ao se aproximar do poço, ouviu um barulho como se houvesse várias pessoas conversando. Para chegar até o poço, é necessário descer uma ladeira, dessa forma, antes de descer as pessoas costumam chamar e perguntar se pode entrar para não correr o risco de encontrar alguém nu tomando banho. Assim, minha mãe se deteve antes de descer e chamou bem alto:
   - ÊÊÊÊÊÊHHHHHHH
Não teve resposta alguma para o seu chamado. Insatisfeita, resolveu perguntar:
    - "Tá banhando?"

Novamente silêncio total. Impaciente, resolveu descer logo e fazer o que tinha de fazer. Ao chegar se surpreendeu, não havia ninguém no poço tampouco vestígios de quem alguém estivera ali recente. Como que por um encanto, ela nem se importou com isso, tomou banho, encheu o balde e se preparou para retornar para casa. Somente na metade do caminho é que mamãe se pôs a refletir sobre quem estava conversando, imediatamente, um arrepio percorreu seu corpo e só então o medo tomou conta dela. Apressou o passo, porém, parece que quanto mais andava mais longe ficava de casa.  Finalmente, pode chegar próximo as casas do vilarejo e por fim chegou na sua casa, ainda pensando no que havia acontecido. 

      Que vozes eram aquelas? Quem estava falando? O quê estavam conversando? Seria uma assembleia dos encantados do poço e da mata? Seria uma reunião dos espíritos condenados a vagar?

         Assustada, contou para mamãe Maria e também para dona Helena, incrivelmente, ambas disseram que na ocasião em que foram sozinhas ao poço no período da tarde, teriam ouvidos o "converseiro". Mamãe, que até então pensava que talvez poderia ter sido fruto de sua imaginação pois estava absorta em seus pensamentos, teve certeza que algo sobrenatural aconteceu ali e que ela havia ouvido uma conversa do além. Nunca mais se atreveu a ir no poço de Vito sozinha, assim como as outras pessoas que também ficaram com medo. 
      
    Em 2007, junto com outros vizinhos perfuramos um poço artesiano, e anos depois perfuramos outro em casa mesmo. São 10 anos que não vamos ao poço de Vito, mas somos gratos a Deus pela sua existência pois tantas vezes nos serviu.

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